Cartas sempre foi um tema que
mexeu comigo. Na velocidade com que as coisas acontecem, não foi diferente com
a comunicação. Ela evoluiu da carta escrita manualmente, para a datilografada e
daí, rapidamente para o sistema de e-mail[1]
e dele, para um sistema mais rápido ainda, que são os WhatsApp[2],
tão utilizado, pelo mundo dos jovens, até mesmo pelo mundo político.
A Carta[3]
é uma maneira direta de se comunicar, ela é uma comunicação de um para um. A
Carta espera uma resposta, diferente das Epistolas que serviam para que nelas
fosse transmitido um comunicado solto. Trazendo isso para o mundo de hoje, as
Cartas estão para os e-mails assim como a Epistolas[4]
estão para os posts nos blogs, uma ideia independente que pode ou não ser lida, ou até
mesmo comentada pela população para quem ela foi dirigida.
Foi nesta linha que as cartas
entraram na minha vida e me fizeram pensar o quanto elas foram importantes e
têm sua participação na formação e conceitos no meio científico, no meio
político, e no meio religioso.
Foram as cartas que aproximaram
pessoas. Foram as cartas que promoveram namoros entre casais que se conheceram e
até mesmo o levaram ao casamento. Foram as cartas entre filósofos que no mundo
da filosofia evoluíram para grandes obras, como o anti-Edipo uma relação entre
Deleuze e Felix Guttari em 1972. Foram através das cartas que os reis se
dirigiam aos principais súditos transmitindo ordens e destituindo-os de cargos,
assim como Bolsonaro fez ao exonerar o ministro Gustavo Bebiano no dia 18 de
fevereiro, só que nos dias de hoje isto ocorre através do WhatsApp.
As cartas são temas que
encontramos em muitas letras cantadas por Roberto Carlos, como na música "Cartas
de Amor", onde ele diz que ontem tinha relido as cartas que tinha escrito com
frases repletas de amor, hoje, talvez ele mandaria um e-mail que seria muito
mais rápido e a eleita levaria consigo em seu iPhone para mostrar o que tinha
recebido do seu amado e ele dizendo que as lembranças deixadas nas velhas frases
foram ditadas pelo coração.
Cesar Passarinho na música “O
Guri”, ao meu ver é uma das mais bonitas de seu repertório, diz em determinado
momento “Hei de ter uma tabuada e o meu
livro Queres Ler; Vou aprender a fazer contas e algum bilhete escrever;
Pra que a filha do seu Bento saiba que ela é meu bem querer; E se não for
por escrito eu não me animo a
dizer”.
Escrevi muitas cartas de amor, de
algumas recebi respostas, de outras não. Das que não recebi respostas, não sei
se elas chegaram nas mulheres para quem mandei e que foram meus amores
platónicos de guri, mas se fosse hoje, eu com certeza teria mandado um WhatsApp
e controlaria para ver se elas tinham recebido e se tinham lido. Mais tarde
evoluí, e em vez cartas mandei e-mail apaixonados, dizendo que na noite escura
eu tinha perdido o sono pensando nela.
Foi através de cartas entre eu um
provável parente de São Paulo, que comecei a me interessar pela genealogia[5]
e assim surgindo a página “A Família Stona no Brasil”. Jacques Stona tinha uma
letra bonita, como todos aqules que gostavam de escrever cartas e foi através
de inúmeras, que fiquei sabendo que na Itália, na Região de Foza tem os Stonas
de Sotto e os Stonas de Dopo. Hoje, com certeza, graças a existência da internet
e através de facebook, WhatsApp e dos e-mails, minhas pesquisas teriam tido
mais sucesso, claro, com a ajuda do Jacques.
As cartas levam muito tempo até
chegarem no destino final. Elas tinham que ser escritas, revisadas, relidas,
colocadas em um envelope, levadas no correio e a partir daí, aguardar uma
resposta, que também levava muito tempo.
Deleuze, segundo David Lapujade
no livro “Cartas e outros textos” publicado pela Editora n-1 edições, na troca
de cartas com colegas, chegava a levar até um ano para receber ou mandar
respostas sobre assuntos. Em 18 de novembro de 1982 ele escreveu para Arnaud
Villani se queixando de uma insuficiência respiratória, mas comentado a
vivacidade por ele ter captado sua ideia e sita um texto de Nietzsche onde este
escreve que um pensador lança uma flecha e um outro pensador a apanha e a
lançará por sua vez a um outro …, ai completa dizendo que “o senhor apanha bem
minha suposta flecha. Depois desta carta, curiosamente só vai escrever outra a
Villani em maio de 1983, seis meses bem certo entre uma e outra dizendo que
tinha ficado feliz em ter recebido notícias dele e ter lido os textos escritos
pelo Villani e não estava disposto a escrever o prefácio de um livro que falava
sobre ele.
Hoje nossas respostas são imediatas
e não fizemos nem por e-mail nem por WhatsApp, pegamos o telefone ligamos perguntado
se o outro aceita ou não aceita participar de um livro.
Em uma das cartas que Deleuze
escreve para Pierre Klossowski em 1978, comentando sobre a participação de
Pierre no filme Reberte dirigido por Zucca, inicia pedindo desculpa por estar escrevendo
muito tarde, no final ele diz em PS 1 que não consegue mais fazer uma carta, e
que acha isso terrível, mas se declara que gosta do efeito solidão. Em abril de
1979 ele volta a escrever sobre o mesmo assunto, mas cinco meses depois? Nesta
época ele ainda não tinha terminado de escrever com Felix o livro Mil platôs
que só vai acontecer em 1980.
As cartas na vida dos nossos filósofos
tiveram uma importância muito grande, pois Deleuze escreveu com Felix, entre
outras obras, Mil Platôs e o anti-Edipo tem O que é a Filosofia, o tema que
inquietou Deleuze por muito tempo, como ele diz em outras cartas para outros
colegas.
Assim como podemos ver, foram nas
cartas que também, Nietzsche, Voltaire e Freud desenvolveram grandes conceitos
e como li certa vez, que a escrita, a linguagem e as palavras dos poetas e
religiosos, foram o caminho pelo qual os antigos iniciaram a formação da
humanidade, estudo há anos este tema.
[1] O e-mail
surgiu para a troca de mensagens entre usuários de computadores, o
primeiro que se tem notícia, foi no ano de 1965.
[2]
O Whatsapp foi criado em 2009 por Jam Koum e
Brian Acton em 2009, mas só se tornaram realidade.31 de ago de 2015
[3]
As Cartas são consideradas o meio de comunicação mais antigo
do mundo. Reis do antigo Oriente Médio já escreviam cartas. Alguns estudiosos
apontam, dizem que a carta é a mãe de todos os gêneros textuais. Antigamente, a base da comunicação era a carta.
Fonte: Correio Popular de Campinas
(14/01/2008)
[4]
A Epístola, vem do grego, significa ordem, mensagem e, possui
significado semelhante à carta escrita e não assinada. São textos escritos em
forma de carta, seja com objetivo ou não de ser enviada ou obter respostas.
[5] Estudo
que estabelece a origem do indivíduo e da família,